Stoa 30 / Falsos Profetas do Design
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Antes de discutirmos o assunto principal, vamos compreender rapidamente a origem da palavra profeta, pois acredito que ter essa base é fundamental para evitar confusões sobre a direção da minha reflexão nesta edição.
A palavra tem como origem o grego “prophétes”, cujo significado vem de “advogar ou discursar em público”.
“Em latim propheta, "interprete" ou "porta-voz" especialmente dos deuses, "inspirado pregador ou professor", de pro - "à frente, mais adiante" ou "para, em nome de", mais a raiz phanai - "falar". Ou seja, uma pessoa que falava "o que ia acontecer mais adiante" ou "em nome de alguém".” 1
Assim, um falso profeta nada mais é que um charlatão, ou seja, uma pessoa que faz previsões que não se concretizam. Ou, para ser ainda mais claro: um grande golpista. Uma pessoa que mente e engana outros com o objetivo de obter benefícios próprios, que geralmente incluem riqueza e/ou poder.
O Profeta da Palavra dos Últimos Dias do Design
Não há nada de errado em cobrar pelo conhecimento adquirido, organizado e disponibilizado para a comunidade de Design. Essa refinamento é um processo demorado e trabalhoso. E se feito com qualidade, nada mais justo do que estabelecer uma troca benéfica para todos os envolvidos pelo trabalho realizado.
O problema, na minha opinião, está no discurso de venda profético que promete sucesso e salários de 5 dígitos apenas com a compra de curso X ou a aprendizagem da ferramenta Y.
Vender esse tipo de narrativa não é ético. E não é ético pelo simples fato de que nem todo mundo parte do mesmo ponto de partida ou terá as mesmas condições ou obterá os mesmos resultados que a pessoa por trás do discurso teve ou diz ter. Simples assim.
Nivelar o resultado de uma experiência pessoal, como se fosse facilmente replicável, revela uma falta de compreensão na diversidade pela qual a vida se manifesta. Usar isso como argumento para dizer que “se eu consegui, você também consegue” é simplesmente uma grande demonstração de falta de caráter.
Analisando os Sinais
Não é necessário muito esforço para identificar esses falsos profetas quando você possui discernimento para identificar sinais de incoerência. Basta parar um pouco, analisar o cenário e relacionar aquilo que a pessoa vende com quem ela é.
A lista a seguir são as métricas que utilizo para analisar se a pessoa que está por trás do conteúdo merece atenção ou se é melhor evitar.
Tem um bom histórico profissional? Essa é a primeira pergunta que você deveria fazer. Se a pessoa está vendendo curso de UI ou UX mas não tem experiência em nenhum negócio, nem portfolio que comprovem sua narrativa, desconfie. Gravar vídeos ou gravar um podcast todo mundo consegue. E nem sempre isso é sinal de relevância. Se a pessoa não tem profundidade ou conhecimento no que fala, é quase certo que também lhe falte bom senso.
Promete retorno financeiro? Se o foco do discurso é quanto dinheiro você vai ganhar ou quanto seus alunos estão ganhando, é bem provável que a primeira preocupação dessa pessoa não é com o conteúdo que ela entrega. Uma pessoa cujo foco é ensinar sabe que qualquer retorno financeiro é esforço de um trabalho individual e não uma fórmula replicável.
Fala que vai revelar um segredo? Se a pessoa se coloca como detentor de uma verdade absoluta que só ela sabe e que é a única maneira que realmente funciona, desconfie.
Ancora-se em gatilhos de marketing digital para vender curso? Não sou contra a usar artifícios psicológicos dentro do design, mas acredito que exista um limite. Chamadas de vídeo sensacionalistas, descrições ou textos exagerados e discursos inflamados deveriam levantar um alerta para questionar a real intenção daquele material.
Usa uma retórica violenta ou prega verdades absolutas? Aqui entram as pessoas que falam com tons agressivos, irônicos ou catastróficos. Sempre com tom de superioridade como se fosse o detentor da razão. Uma pessoa preocupada genuinamente em compartilhar conhecimento faz isso de maneira educada e comedida. Sem necessidade de chamar atenção ou teatralizar sua comunicação.
Conhece outros sinais? Deixe nos comentários.
Uma Motivação Mais Virtuosa
Embora a interpretação do que sejam as virtudes possa variar significativamente entre diferentes culturas, todas buscam, em última instância, o alinhamento com ideias nobres que nos conduzem a um caminho de aprimoramento contínuo.
Assim, acredito que, para concluir a análise a respeito dos falsos profetas, seja fundamental examinar quais ações essas pessoas praticam em suas vidas, buscando sempre, é claro, aquelas que se alinham com a bondade e a virtude.
Ela faz o bem?
Ela ajuda os outros sem esperar obrigatoriamente um retorno financeiro?
Ela é solidária?
Seu conhecimento é profundo?
É reconhecida por um bom trabalho?
É uma pessoa receptiva?
Seu real interesse é colaborar com uma evolução coletiva?
O que ela compartilha engrandece os outros?
Cultiva humildade intelectual?
Entende o impacto que possui na vida alheia?
Trata os outros com respeito e igualdade?
Os melhores professores que tive sempre demonstraram um entusiasmo contagiante ao ensinar algo. E sempre nutriram diversas virtudes da lista acima. Para eles, a paixão em compartilhar conhecimento sempre foi a principal motivação por trás da criação de conteúdo.
Sobre o Conhecimento Técnico e Prático
Além da separação entre falsos profetas/influencers e professores/criadores de conteúdo, precisamos também adicionar uma sub-categoria ao segundo grupo.
Nem sempre um bom criador de conteúdo é um designer que possui artefatos de design com boas qualidades. E não vejo problema nenhum quando o assunto ensinado não envolve diretamente a produção de um artefato. Por outro lado, se o assunto também requer um conhecimento técnico e este não está presente, talvez seja melhor buscar outras referências.
Cabe a você identificar se essas qualidades estão presentes. E, se ainda assim você optar por seguir qualquer tipo de pessoa que não nutre boas qualidades, talvez design não deveria ser sua prioridade de estudo no momento.
“A galera confunde influencer com criador de conteúdo” — Diego Eis.
A mensagem final que deixo é essa: não tenha influencers de estimação. Seja criterioso com o conteúdo que você consome. Busque valores ao invés de falsas promessas. Não se deixe seduzir pela prosperidade sem esforço. Se apaixone pela busca do conhecimento e não pelas pessoas que o compartilham.
Até a próxima!
Update: O Rodrigo Lemes fez um vídeo bem interessante sobre o assunto que complementa essa edição da Stoa.
O que rolou por aqui:
Estou produzindo a próxima aula do Componentes de UI Design e será sobre cores! Vou abordar dois espaços de cores: HSL e LCH, cores primitivas e semânticas, e como criar essas variáveis no Figma.
Dificilmente podemos garantir o sucesso de alguma coisa. O que podemos é criar as condições ideais para possibilitar que o sucesso aconteça. Essas condições, de acordo com Mr. Joe, são: Visão + Habilidades + Incentivos + Recursos + Medições + Plano de Ação = Sucesso. A falta de qualquer um deles aumenta a distância do sucesso.
O Rafael Frota escreveu uma série de dicas de como ter sua voz ouvida (e não interrompida) quando você está apresentando seu trabalho.